quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

CRÉDITO E DESCRÉDITO



Dr. Flagrâncio, o delegado, adentra os suntuosos aposentos do temido imigrante italiano, Don Oblivio Iure, que o convida a sentar-se. Em uma poltrona, à sua frente, acomodou-se o anfitrião, indagando, desde logo, as pretensões do policial:

Delegato! Quantas vezes io já diche que non precisamos de polícia em questa regione? Io garanto a segurança acá, capiche?

–Sim, eu sei, Don Iure, mas eu fiquei sabendo que o seus homens andam ficando cada vez mais cruéis com os cidadãos! E havíamos combinado que a polícia não interviria no seu território, desde que as leis fossem respeitadas o que não vem acontecendo.

Ma como?! – Don Iure, então, volta-se para um de seus guarda-costas – Chama logo il consigliere! Perdona-me, delegati, ma pedi para que mio consigliere cuidasse para que nostra família respeite todos os entendimentos dos Tribunais Superiores.

E, nisso, chega o consigliere que, sabatinado pelo chefão, começa a explicar-se:

–Pois que o delegado indique onde a lei é descumprida para tomarmos providências!

–Ora, vocês estão impondo juros extorsivos sobre os “favores” financeiros que prestam o que torna as dívidas impagáveis. Isso é crime de usura, segundo o Decreto 22.626/30.

E o consigliere, de dedo em riste, fazendo que não com a cabeça, contesta:

–Não, signore! Pensando nisso, abrimos uma financeira no nome da família. Cosí, pela súmula 596 do Supremo, não se aplica a nós a Lei da Usura. Além disso, a súmula 382 do STJ diz que cobrar juros acima de 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.

–Ora, mas isso não justifica a cobrança de taxas exageradas e abusivas! – Intervém o policial.

–Mas o que é exagerado, dottore? A lei não diz! A súmula 381 do STJ dispõe que nem o juiz pode conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas...

Sabendo que as informações eram precisas Dr. Flagrâncio mudou de rumo:

–Mas e quanto a esta lista que vocês fazem dos de clientes inadimplentes? Isso não seria intimidação e constrangimento ilegal?

–Constrangimento é inscrever os devedores no SPC e no SERASA que são visíveis no país inteiro! Que culpa temos que ninguém quer ter o seu nome inscrito na “listinha” do Don? Além disso, damos ciência pessoalmente ao cliente da sua inclusão na lista, algo de que é dispensado pela súmula 404 do STJ.

Frustrado, Dr. Flagrâncio deixa mansão de Don Iure. Na viatura, indagado por um de seus agentes, desabafa:

–É, bem que eu queria descer aquelas escadarias com aquele gângster algemado, mas nem que eu pudesse prendê-lo poderia algemá-lo, por causa desta última decisão do STF. Mas o que mais me dói é que as taxas que ele oferece são menores que as do meu Cartão de Crédito, e a minha dívida só faz aumentar.

E o agente indaga:

–Mas e por que o senhor não faz um empréstimo com o Don?

–Pois eu tentei.

– E aí?

–Eles consultam o SERASA...


http://www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=17219